Eram quatro da madrugada. Todos a adormecer. Ouvia-se apenas o Tic-Tac no silêncio sepulcral daquela noite. Marcos de fininho abriu a geladeira. Pegou um copo d'água. Reservou. Cuidado para não fazer barulho e provocar um grande espanto. Seu irmão era de sono leve. Seu pai às vezes ia à cozinha fumar um cigarro de madrugada. Quem sabe se o galo cantasse, ou algo ruisse, alguma coisa poderia interromper, não tinha como, ouvidos aguçados, respiração cuidadosa. Ai se espirrasse ou tossisse. Pegou o copo de água e partiu para a sala, onde abriu um grande cofre de moedas e colocou sua mão entre elas, e, em grandes pegadas, amontoava-as na boca, garganta abaixo, apressadamente. Engoliu todas, finalmente voltou a dormir. O ritual se repetia constantemente, em necessidade inconsciente. Não sabia, mas diariamente seu pai enchia novamente o cofre, em silêncio. Não lembra mais das crises de abstinência. Vício. O jeito era sustentar. Ainda que à omissão.
Marcos faleceu aos sete anos no dia que mudou o horário de verão.
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